Resenha 111 | O Garoto Quase Atropelado

Título: O Garoto Quase Atropelado
Autor: Vinícius Grossos
Editora: Faro Editorial | 2015 | 272 páginas

Sinopse: Um garoto sofreu com um acontecimento terrível.

Para não enlouquecer, ele começa a escrever um diário que o inspira a recomeçar, a fazer algo novo a cada dia.

O que não imaginou foi que agindo assim ele se abriria para conhecer pessoas muito diferentes: a cabelo de raposa, o James Dean não-tão-bonito e a menina de cabelo roxo, e que sua vida mudaria para sempre!

Prepare-se para se sentir quase atropelado de uma forma intensa, seja pelas fortes emoções do primeiro amor, pelas alegrias de uma nova amizade ou pelas descobertas que só acontecem nos momentos-limite de nossas vidas.

Estar vivo e viver são coisas absolutamente diferentes!

Resenha

Tive a oportunidade de ler O Garoto Quase Atropelado por meio da gentileza do autor, Vinícius Grossos, ao indicar o My Queen Side para receber um exemplar de cortesia diretamente da Faro Editorial. Fiquei muito feliz pelo carinho da indicação e, especialmente, por ter apreciado em primeira mão essa história emocionante.

O garoto quase atropelado é nosso protagonista e, ao longo do livro, não sabemos seu nome. Sabemos apenas se tratar de um adolescente de 17 anos, prestes a completar 18, que se sente preso à solidão, revolta e sofrimento. O livro é em formato de diário. Devido ao seu quadro depressivo, o garoto quase atropelado está fazendo terapia e foi uma recomendação que passasse a escrever seus sentimentos durante um mês para lidar com o que lhe aconteceu.

O livro é belo,
incluindo a lombada.

É impressionante como a vida dele muda nesse período. Foi em uma tarde entediante, enquanto andava de bicicleta, que nosso protagonista foi quase atropelado por uma jovem – daí o título e a capa maravilhosa do livro. A jovem em questão fora um mistério desde o início: sua beleza, sua vivacidade, seus cabelos que lembravam a cauda de uma raposa, seu jeito espontâneo… Essa jovem, da qual o garoto quase atropelado nem sabia o nome, não saía de seus pensamentos.

Então, a vida o brindou com a oportunidade de reencontrá-la. Acompanhada de dois amigos, todos acabaram interagindo sem nem se apresentarem. A amizade entre o garoto quase atropelado e esses três personagens começou assim, fora dos padrões sociais, e perdurou à margem de tudo o que poderíamos esperar. Eram eles:

A garota com cabelo de raposa, chamada Laís.

O garoto que parecia James Dean-não-tão-bonito, chamado Acácio.

A garota com cabelo roxo, chamada Natália.

O garoto quase atropelado, nosso protagonista.

O livro retrata as aventuras que esse grupo vive, mas também os desafios que cada personagem enfrenta. Abuso sexual, abuso de álcool e tabaco, homossexualidade, bullying, suicídio, luto, bulimia, depressão, lares desfeitos… são temas polêmicos que o autor abordou com muita sensibilidade. Vemos que há diferentes maneiras de quebrar um coração e cada uma delas pode ser cruel. Esses personagens, à sua maneira, perderam o que há de mais precioso para viver: a esperança. Desesperadamente procuram se agarrar ao que pode lhes trazer algum sentido e, aos poucos, amadurecem com os próprios erros ou sucumbem às más escolhas.

Lançamento da obra na Bienal.

Eu estive presa à história, de um jeito que me fazia sentir enorme vontade de abraçar cada um dos personagens e conversar. Queria ser capaz de confortar suas dores e, quem sabe, ajudá-los a deixar o passado para trás. Sinto que essa é uma das grandes mensagens desse livro: quão importante é não permitir que o passado ofusque a beleza do que se pode viver hoje. Quantas vezes nos tornamos vítimas das nossas lembranças? Quantas vezes permitimos que a dor leve embora, também, a nossa capacidade de reconstruir a felicidade? Vinícius Grossos escreveu uma obra que surpreende, encanta e faz o coração sangrar. A vida é injusta, isso é um fato, mas pode ser igualmente bela se aprendermos a amar e nos deixar amar. Se aprendermos a perdoar a nós mesmos. Se aprendermos a expressar nossos sentimentos. Se aprendermos a aceitar a ajuda de quem nos quer bem.

Eu me apeguei a cada um dos personagens, pois todos foram bem caracterizados. Laís, no entanto, foi de longe a mais complexa. Assim como o protagonista, senti-me à mercê das suas caprichosas atitudes, mas compreendi serem uma gritante expressão da sua dor.

O final me levou às lágrimas. Foi impossível não me sentir, de certa forma, atropelada pelo desfecho. Soltei um sonoro: não acredito que o autor fez isso! Senti-me magoada, revoltada, impotente. Ao mesmo tempo, acho que não haveria melhor mensagem. No final da obra, há uma página que pode ser arrancada para ser queimada. Ainda o farei, mas por enquanto não me sinto pronta. Estou agarrada à história.

Como aspectos negativos, destaco que até a centésima página há fortes semelhanças com a obra As Vantagens de Ser Invisível, do autor Stephen Chbosky. Eu me senti preocupada se essa inspiração acompanharia a narrativa como uma sombra por muito tempo. No entanto, Vinícius Grossos passou a desenvolver o enredo de maneira completamente distinta e mostrou a que veio. Apesar da diagramação e capa belíssimas da Faro Editorial, flagrei alguns erros de revisão ortográfica, mas nada que prejudique o entendimento.

Algo que não posso deixar de elogiar é a adorável ambiguidade do título! O Garoto Quase Atropelado diz respeito, de fato, à experiência literal que o protagonista viveu. Mas, também, se refere àquele sentimento que antecede o quase atropelamento, quando o coração se agita no peito e ganhamos uma nova chance para viver.

Sabe aquele momento em que você realmente é quase atropelado por alguma coisa, e num lapso de segundos vê a sua vida passando rápido através dos seus olhos, mas então nada de grave acontece e você está apenas lá, parado, os olhos assustados, o medo cantando aos ouvidos, e o coração martelando de forma doentia?
Aí, é nesse instante que percebe que está tudo bem, você respira e é como se tivesse mais uma oportunidade. E, no fim das contas, tudo se resume a apenas a isso: você realmente se sente vivo! (p. 28)

Desejo a todos a emoção desse livro, que altamente recomendo!

Que nos sintamos sempre quase atropelados, no melhor sentido que a vida puder nos dar.

Avaliação:

Compartilho os meus quotes favoritos:

– Eu gosto de tipos diferentes de meninas. (…)

– Diferentes, como?

– Bem... Meninas que tenham algo que as tornem únicas.

– Nossa! Que definição complexa e original. E você já encontrou alguma menina assim?

Meu coração parou por um segundo.

– Só uma. (p. 41)

– É que… – Sustentou o meu olhar. – …parece que você é uma piscina carregado o peso de uma lagoa, bem perto de transbordar. (p. 44)

– Acho que por trás de toda pessoa que parece poderosa existe alguém bem frágil e com a alma cheia de buracos. (p. 74)

– …nós não podemos controlar o sentimento que a outra pessoa vai entregar pra gente... Mas podemos escolher se esse sentimento é bom o suficiente para nós. (p. 76)

…quanto mais você veste uma carapaça, finge ser mais forte do que é, menos oportunidade para resolver o problema ou se tornar mais forte você tem. O tempo gasto em fingir e agir como se já soubesse de tudo impede você de aprender. (p. 81)

Nunca tive problemas para aceitar que a morte é a única verdade da vida; que seu poder é inevitável e que todos iremos morrer um dia. O doloroso mesmo é que, infelizmente, o momento de algumas pessoas chega mais cedo do que deveria. (p. 89)

– Você, garoto quase atropelado, ainda vai partir muitos corações. (…)

– Mas eu não quero partir corações, Laís. Eu só quero um coração e que ele me queira também, e que cuidemos um do outro justamente para não nos partirmos. (p. 105)

– Laís, você não percebe? A cada momento que você me leva para seu mundo e depois me cospe fora, você destrói um pouco de mim. (p. 177)

Depois de uma dor profunda, quem não pensaria na hipótese de se fechar, para evitar sofrer de novo? Acho que todo o mundo um dia já quis ser frio o suficiente, babaca o suficiente, vazio o suficiente, para simplesmente não se importar. Mas está aí uma grande questão: o fato de desejarmos não nos importar já mostra de certa forma que nos importamos. (p. 184)

Acredito que todas as pessoas que entram em nossas vidas o fazem por algum motivo. Não é algo meramente casual. (p. 257)

Aprendi que só é possível sofrer menos quando a gente aceita a dor, aceita falar sobre ela. Senão, é como se agente tentasse apagar uma morte matando uma pessoa duas vezes. E isso faz doer mais e para sempre. (p. 265)

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Vinícius Grossos, 22, é taurino, leitor voraz e perseguidor de sonhos. Ama comida italiana, dias nublados e café. Nasceu em 1993, no estado do Rio de Janeiro e, quando pequeno, tinha o sonho de trabalhar em uma livraria apenas para poder ler tudo o que fosse possível. Já quis ser desenhista, mas sua falta de talento o ajudou a se encontrar de vez como escritor. Publicou seu primeiro livro, Sereia Negra, em 2014, e participou de diversos eventos e feiras literárias.

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